sexta-feira, 23 de dezembro de 2016

A esquerda caviar...e o politicamente correcto


O mundo dito civilizado vive uma crise moral de grandes proporções. 
Há uma clara decadência de valores em curso, que ameaça a própria sobrevivência do mundo moderno como o conhecemos. Ideias têm consequências, e um conjunto equivocado delas tem minado o progresso e a liberdade individual. Por trás dessas ideias, encontramos uma parcela vaidosa, oportunista, acovardada e mimada da elite, que parece só pensar no curto prazo e em sua própria imagem. 
“Vaidade de vaidades, diz o pregador, vaidade de vaidades! Tudo é vaidade.” 
A mensagem bíblica merece a atenção de todos,especialmente no mundo actual, onde vale tudo pela “autoestima”. Nunca antes na história da humanidade vivemos uma era das aparências tão evidente. 

O "status" de se ser um tipo porreiro, o mr. nice, possui enorme valor emocional e comercial. 
E a internet, com suas redes sociais, é uma máquina de vender imagem, que acaba por potencializar esse sintoma — que não é novo.  Mais do que a ação em si, o que importa agora é o tal “marketing do comportamento”, o "feel good, sensation". Isso acabou resultando numa ditadura velada do politicamente correto, cujos adeptos buscam monopolizar as boas intenções e os sentimentos “nobres”, em detrimento do debate sobre os melhores meios para se catingir tais metas. 
Só quem concorda com os seus meios — leia-se: sempre mais estado — defende os pobres, os negros, as mulheres, os gays, o meio ambiente, a paz.
É a tirania das (supostas) boas intenções, aos cuidados dessas “almas sensíveis”. Nas redes sociais, essa gente é chamada de poser, já que tudo se resume ao objetivo de ficar bem na fotografia. Somente eles desejam um mundo melhor.

Essa tendência é sedutora, pois basta abraçar um conjunto de crenças para ser visto como — e para se sentir — uma boa pessoa. 
Não serão as acções, o comportamento efectivo e a conduta cotidiana que determinam que alguém seja mais decente mais louvável, mas apenas as frases soltas e o facto de pertencer a um determinado grupo. Alardear nobres intenções bem alto, eis o principal objetivo. Edmund Burke já havia alertado para isso em suas reflexões sobre a Revolução Francesa:
"Só porque meia dúzia de gafanhotos sob uma samambaia fazem o campo vibrar com o seu inoportuno zumbido, enquanto milhares de cabeças de gado repousando à sombra do carvalho inglês ruminam em silêncio, por favor, não vá imaginar que aqueles que fazem barulho são os únicos habitantes do campo. Não significam  mais do que um pequeno grupo de insetos efêmeros, secos, magros, saltitantes, espalhafatosos e inoportunos".

Ou, como resumiu ainda mais Mark Twain, 
“Barulho não prova nada: uma galinha põe um ovo e cacareja como se tivesse posto um asteroide”. 
Mas fazer barulho é com a esquerda caviar mesmo. O termo tem origem na França (gauche caviar), como não poderia deixar de ser. 
Mas há os análogos na Inglaterra (socialista champagne), nos Estados Unidos (liberal limusine) ou na Itália (radical chic). Os artistas e os intelectuais tornaram-se os grandes ícones desse movimento. 
Todas as causas vistas como nobres são abraçadas por essa gente, que parece infnitamente mais preocupada com os aplausos da plateia e com a própria sensação de superioridade moral do que com os resultados concretos daquilo que prega.
Salvar o planeta, proteger os índios, cuidar das crianças africanas, enfrentar os ricos capitalistas em nome da justiça social, pagar a dívida histórica com os negros, acabar com as guerras, enaltecer as diferenças culturais, estas são algumas das bandeiras dos abnegados artistas e auto proclamados
intelectuais. promovem-se como os grandes defensores dos fracos e oprimidos contra as “elites” — como se eles não fossem parte da elite.


Há um pequeno detalhe: normalmente, muitos deles são ricos graças ao capitalismo que atacam,
vivem no conforto do Ocidente que desprezam, gozam da liberdade de expressão inexistente em Cuba e noutros "paraísos" socialistas que tanto proclamam, e ainda desfrutam da paz e da segurança 
conquistadas pelo poder militar do Tio Sam que abominam. 
É divertidíssima a esquizofrenia destes "artistas" e intelectuais de esquerda: admiram o socialismo de Fidel Castro, mas adoram também as coisas que só o capitalismo sabe dar — bons cachês em moeda forte, ausência de censura e consumismo burguês.,São os filhos de Marx numa relação adúltera com a Coca-Cola...

Em português mais claro: a velha e conhecida hipocrisia! 
A marca registrada dessa esquerda caviar, que adora o socialismo do conforto de Paris, que prega uma radical mudança no estilo de vida dos,outros para mitigar o aquecimento global, é a antiga máxima “faça o que eu digo, não o que eu faço”.
La Rochefoucauld disse tudo quando afirmou: 
“A hipocrisia é a homenagem que o vício presta à virtude.”

A esquerda é mestre na arte de pregar uma coisa publicamente e fazer o oposto na esfera privada. 
Talvez o melhor exemplo seja a postura em relação às escolas públicas, sempre defendidas com fervor ideológico, em detrimento da receita liberal dos  vouchers, postulada por Milton Friedman e que permitiria o acesso dos mais pobres às melhores escolas privadas.
Mas os típicos esquerdistas não querem saber dessas escolas públicas na prática. Al Gore, Bill Clinton e, sim, até Obama são exemplos de esquerdistas que não pensaram duas vezes: colocaram os seus filhos em caras instituições de ensino privadas de elite.

O mesmo vale na hora de cuidar da saúde. 
Hospital público? Nem pensar! Essa nata da esquerda não coloca seus pés delicados em um hospital público nem que a vaca tussa. 
Eles tratam-se nos melhores e mais caros hospitais privados, e logo depois pregam as maravilhas do Obamacare, da saúde universal, do SNS, que os pobres precisam enfrentar num calvário pela sobrevivência.
Mas o discurso desta gente, não muda: a esquerda monopoliza as boas intenções para com os pobres, ou seja a solução estatal... sempre para os outros!
Não há nada de errado em querer ganhar mais, em educar a família dentro de certas tradições ou em combater os bandidos, ainda que com a ameaça de uso de violência. 
A hipocrisia da esquerda, portanto, serve para fazer aquilo que é positivo para o indivíduo, e isso diz muito sobre sua teoria. Se de facto seguissem o que pregam, isso sim, seria terrível. 

Maso  seu intuito é todo voltado para o discurso, para a imagem, e não para as acções concretas.
Para preservar as aparências, apelam constantemente para o uso de “um peso, duas medidas”.
Basta se dizer de esquerda para ganhar uma espécie de salvo-conduto para cair em contradições e ficar isenta do mesmo critério com que outros são julgados. 
Pertencer à esquerda é suficiente para ficar blindado contra as críticas: como ousa questionar minhas lindas intenções?
Típico da esquerda caviar é ter a memória bastante selectiva, não recordar as bandeiras e os ídolos defendidos no passado que se mostraram terríveis com o 
tempo. A autocrítica é algo simplesmente raríssimo quando se trata desta gente. 
“Esqueçam o que eu disse” costuma ser o mantra da esquerda caviar, para poder pular de galho podre em galho podre como se nada tivesse acontecido.


Há quem pense que não vale a pena enfrentar esta gangue, porque disso se trata, que eles são inofensivos.
Discordo veementemente. A influência das ideias nos rumos da Humanidade não pode ser subestimada, e esses artistas e intelectuais famosos conferem credibilidade a regimes nefastos. 
Na era da internet, o efeito é ainda mais poderoso, por ser viral.
Hollywood foi amplamente utilizada pelos vermelhos, para fazer passas a sua mensagem. 
Não deveria ser assim, mas o que os artistas famosos falam sobre política acaba tendo influência nos mais leigos.

A vitória de Barack Obama nas duas eleições contou com um enorme aparato ligado às celebridades,uma verdadeira máquina de propaganda política. 
Inúmeros atores e cantores famosos foram mobilizados para “vender” o sonho utópico de que tudo seria completamente diferente com a chegada do “messias” à Casa Branca. 
Por isso mesmo, expor o abismo entre discurso e prática torna-se fundamental para reverter o estrago causado por eles.

NÃO DEVEMOS CONFUNDIR A ADMIRAÇÃO À OBRA DO ARTISTA COM A SUA PRÓPRIA PESSOA OU SUAS IDEIAS POLÍTICAS.

Podemos respeitar ou até idolatrar certo músico, sem que isso signifique que as suas ideias políticas devam ser também aceitas. 
Podemos condenar a conduta hipócrita de um famoso arquitecto, e ainda assim reconhecer sua importância no seu campo de trabalho. 
Podemos aplaudir de pé um excelente actor, e de seguida condenar os o seu discurso hipócrita.
Quem foi que disse que actores e músicos são especialistas em economia e clima? 
Constatemos o óbvio:um canalha será sempre um canalha, mesmo sendo um excelente músico, pintor ou actor. 
Devemos separar uma coisa da outra. 
O que deve ser destacado, o é a visão ideológica dos artistas e intelectuais da esquerda caviar, assim como as suas contradições entre discurso e prática.  
A matemática de Newton não prova nada em favor desua teologia. [...] 
Platão escreveu maravilhosamente bem, e esta é a razão pela qual muita gente acredita ainda na sua filosofia. 
Tolstoi foi um excelente romancista, mas não constitui isto razão para que deixemos de considerar detestáveis as suas ideias sobre a moral, ou para que sintamos outra coisa que não seja desdém pela sua estética, pela sua sociologia e pela sua religião.
Não basta que um sujeito seja um bom músico e que combateu uma quaquer ditadura para se tornar num grande pensador político. 
Não basta um arquitecto seja mundialmente famoso para que a sua ligação, os seu servilismo com regimes sanguinários e ditatoriais seja esquecido. 
Há que denunciar e combater a gritante hipocrisia desta "escumalha" oportunista que luta por um “mundo melhor”, entre dois flutes de  champanhe, vivendo
á custa do erário publico, em luxuosas casas, e em bairros da elite capitalista...
Não é fácil ser-se um revolucionário de tasca chique, e um porco capitalista sedento por mais lucros e boa vida. 
Mas esta gente da esquerda caviar aceita o sacrifício...

(Introdução do livro de Rodrigo Constantino, "A Esquerda Caviar")

sexta-feira, 28 de outubro de 2016

No tempo do Caparandanda


O povo de Quissange era refractário ao serviço de ganho,  velhaco, desconfiado e muito propenso ao roubo. 

Havia nesta região muitos bandos de salteadores que viviam a emboscar e a assaltar os viajantes, no «Bundianoi» e na «Alunga». 

Estes casos eram frequentissimos em todas as epocas. Estes assaltos veem desde antigos tempos, n'elles se tornou celebre o liame de Caparandanda, do quarto para o quinto periodo, filho do soba Culembe. 

Caparandanda, moço de grande robustez física e de genio arrebatado, levava uma vida de ladrão á mão armada, feito chefe de salteadores. Esperava as comitivas na sua passagem por Quissange e aassaltava-as, roubando-as, sendo o seu principal fito as vazilhas de aguardente que levavam. 

De nada serviam as queixas do gentio e dos negociantes ao soba pai, nem as  admoestações d'este. 

Por fim, Caparandanda chegou ao ponto de se tornar um insubordinado e desobediente á autoridade paterna, chegando a  ameaçar de morte o 'proprio pai. 

Culembe, que era um bom soba, muita estimado peloo seu povo e por todo o povo de Catumbella, mandou dizer ao negociante Antonio Pinto dos Santos, dono do talho da Catumbella, e de quem era muito amigo, que em seu nome pedisse ao Governo a prisão de seu filho Caparandanda, afim de põr termo ás suas tropelias, promptificando-se ele, Culembe, a ajudar o Governo na prisão do filho.

O pedido do soba foi immediatamente atendido, organizando-se uma expedição composta por elementos  militares e civis, e que ficou conhecida entre os indigenas por «Guerra do Caparandanda», efectuando-se a sua prisão em Quissaange, e deportando-se. para fora da província o celebre salteador.

Texto de Augusto Bastos, Maio de 1909

quinta-feira, 22 de setembro de 2016

Quando os filhos voam

Sei que é inevitável e bom que os filhos deixem de ser crianças e abandonem a proteção do ninho. Eu mesmo sempre os empurrei para fora.Sei que é inevitável que eles voem em todas as direções como andorinhas adoidadas.
Sei que é inevitável que eles construam seus próprios ninhos e eu fique como o ninho abandonado no alto da palmeira…
Mas, o que eu queria, mesmo, era poder fazê-los de novo dormir no meu colo…
Existem muitos jeitos de voar. Até mesmo o vôo dos filhos ocorre por etapas. O desmame, os primeiros passos, o primeiro dia na escola, a primeira dormida fora de casa, a primeira viagem…
Desde o nascimento de nossos filhos temos a oportunidade de aprender sobre esse estranho movimento de ir e vir, segurar e soltar, acolher e libertar. Nem sempre percebemos que esses momentos tão singelos são pequenos ensinamentos sobre o exercício da liberdade.
Mas chega um momento em que a realidade bate à porta e escancara novas verdades difíceis de encarar. É o grito da independência, a força da vida em movimento, o poder do tempo que tudo transforma.
É quando nos damos conta de que nossos filhos cresceram e apesar de insistirmos em ocupar o lugar de destaque, eles sentem urgência de conquistar o mundo longe de nós.
É chegado então o tempo de recolher nossas asas. Aprender a abraçar à distância, comemorar vitórias das quais não participamos diretamente, apoiar decisões que caminham para longe. Isso é amor.
Muitas vezes, confundimos amor com dependência. Sentimos erroneamente que se nossos filhos voarem livres não nos amarão mais. Criamos situações desnecessárias para mostrar o quanto somos imprescindíveis. Fazemos questão de apontar alguma situação que demande um conselho ou uma orientação nossa, porque no fundo o que precisamos é sentir que ainda somos amados.
Muitas vezes confundimos amor com segurança. Por excesso de zelo ou proteção cortamos as asas de nossos filhos. Impedimos que eles busquem respostas próprias e vivam seus sonhos em vez dos nossos. Temos tanta certeza de que sabemos mais do que eles, que o porto seguro vira uma âncora que impede-os de navegar nas ondas de seu próprio destino.
Muitas vezes confundimos amor com apego. Ansiamos por congelar o tempo que tudo transforma. Ficamos grudados no medo de perder, evitando assim o fluxo natural da vida. Respiramos menos, pois não cabem em nosso corpo os ventos da mudança.
Aprendo que o amor nada tem a ver com apego, segurança ou dependência, embora tantas vezes eu me confunda. Não adianta querer que seja diferente: o amor é alado.
Aprendo que a vida é feita de constantes mortes cotidianas, lambuzadas de sabor doce e amargo. Cada fim venta um começo. Cada ponto final abre espaço para uma nova frase.
Aprendo que tudo passa menos o movimento. É nele que podemos pousar nosso descanso e nossa fé, porque ele é eterno.

Aprendo que existe uma criança em mim que ao ver meus filhos crescidos, se assustam por não saber o que fazer. Mas é muito melhor ser livre do que imprescindível.

Aprendo que é preciso ter coragem para voar e deixar voar.


E não há estrada mais bela do que essa.
Ruben Alves