José Sócrates não foi a causa da nossa desgraça.
Pelo contrário, José
Sócrates foi o resultado, o produto final, gerado por um sistema
político e educativo ineficiente, iníquo e corrompido. O nosso problema é
estrutural e tem a ver sobretudo com a forma como nos organizámos.
Como todos sabemos, o novo regime privilegiou sempre o amiguismo e o
compadrio ao mérito que, durante muitos anos, identificou com o antigo
regime. Pessoa competente e séria era, inevitavelmente, apelidada de
fascista. As escolas, recorde-se, onde se formaram estas gerações, foram
tomadas de assalto pelos alunos mais medíocres que expulsaram os bons
professores e os substituíram por alunos com o 5º e o 7º ano de liceus
cujo único objectivo era nivelar tudo por baixo.
Ainda hoje o nosso
ensino privilegia os piores alunos e sacrifica os melhores, sentindo-se
subjacente em todo o sistema de ensino público um desprezo incontido
pelos alunos mais brilhantes e mais inteligentes. E é precisamente a
gente que nasceu e cresceu neste caldo de cultura que ainda hoje domina
os sindicatos de professores e o sistema político.Ou seja, todos os poderes decisórios estão hoje na mão de gente medíocre e comprometida com quem lá os colocou.
Tal como num clube desportivo, ninguém pode esperar bons resultados
quando se colocam a jogar os afilhados e se sacrificam os bons
jogadores. E, no nosso país, nos últimos quarenta anos, só têm jogado os
afilhados que, por sua vez, se empenham na eleição de equipas técnicas
pouco qualificadas mas que lhes garantem o lugar na equipa.
Está tudo
viciado.
É assim nas câmaras, nas direcções-gerais, nos serviços
públicos, nas empresas públicas, nos partidos políticos, nas forças de
autoridade, nos tribunais, nos órgãos de comunicação social, nas
escolas, nas universidades…
Este regime é um doente onde o tumor
maligno da corrupção, do compadrio, da incompetência e da mediocridade
se espalhou e ganhou metástases em todos os órgãos. E um doente assim
não tem qualquer hipótese de cura.
Aliás, neste momento, a nossa
vida é puramente artificial e deve-se exclusivamente ao ventilador da
troika. Mas esta situação não se pode manter eternamente. Toda agente
sabe que o doente não vai conseguir sair do estado vegetativo em que
caiu. As medidas do Governo visam apenas convencer a troika a manter o
ventilador ligado por mais algum tempo.
Mas o doente, em boa verdade, já
está morto. Só falta mesmo dar a ordem para desligar a máquina.
Artigo de Santana-Maia Leonardo, em "Cartas à Directora", no Público de hoje.
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