sábado, 28 de novembro de 2020

Pfizer, Moderna e Astrazeneca, as 3 vacinas anti covid


Estamos prestes a ter três vacinas diferentes contra a covid-19, resultado de abordagens científicas diferentes.

Pfizer, Moderna e Astrazeneca, em concorrência, mas cumprindo as boas práticas científicas, criaram em tempo recorde soluções de combate ao SARS-cov-2 com resultados que, ao que os estudos clínicos indicam, permitem ter esperança que possa haver uma solução para a pandemia durante o próximo ano.

Isto é a ciência a funcionar normalmente. A investigação é realizada por laboratórios em conjunto com universidades, os resultados são publicados e avaliados pelos pares, as conclusões são testadas, todo o processo é revisto e fiscalizado por entidades independentes.

Sem a troca livre de informação, sem os especialistas fora do processo de criação e testagem poderem avaliar o que está a ser feito, é impossível ter-se a mínima noção de segurança relativamente ao produto.

É por isso que não podemos confiar no que a Rússia apresenta como a vacina "de 95% de eficácia" Sputnik V.

Por outro lado, sem verdadeira concorrência entre laboratórios, não seria possível o mundo estar prestes a ter à disposição três alternativas para combater a doença. A mais sofisticada, a da Pfizer, precisa ser armazenada a uma temperatura de -80ºC, o que a torna complicada para ser administrada em países sem infraestruturas de criogenia capazes de chegar a estas temperaturas -- a maioria de África é o exemplo comum, mas basicamente é todo o mundo fora de cidades com centros de investigação científica.

Já a vacina da Moderna pode ser conservada a -20º, ou seja, num congelador comum.

Quando à da Astrazeneca, criada em parceria com a Universidade de Oxford, pode ser armazenada a 2º, o que a torna a melhor candidata para distribuição mundial, como escreveu esta semana a Economist. O problema é que por se tratar de uma vacina de vírus inativo, pode ser complicado produzi-la em quantidade suficiente no curto tempo necessário.

Há ainda duas outras vacinas a ter em conta, ambas chinesas. Como é habitual na variante do comunismo chinês, foram desenvolvidas numa espécie de concorrência dentro do próprio estado: um laboratório ligado diretamente ao governo, outro com maior independência, mas totalmente "supervisionado" pelo partido.

A investigação foi secreta, os primeiros testes idem, os resultados da segunda fase foram parcialmente publicados no ocidente.

Depois, fizeram-se contactos com alguns países mais ou menos "amigos" (Brasil incluído) para começarem a terceira fase em grande escala da vacinação. Isto depois de milhões de chineses terem sido injetados com uma outra versão da vacina -- supostamente nenhum efeito secundário foi detetado, segundo a propaganda, perdão, a comunicação oficial do país.

O governo chinês enviou entretanto para a prestigiada revista científica Lancet os resultados de um dos estudos para que seja revisto pelos pares. Este foi publicado e parece de facto ser promissor.

Possivelmente, ambas as vacinas são tão boas quanto as da Pfizer, da Moderna ou da Astrazeneca. Mas podemos mesmo confiar que assim é? Depois de todo um processo sem ponta de transparência em que só nos é mostrado o resultado final?

Se funciona, não quero saber como lá chegaram, poderão dizer.

A saúde é demasiado importante para uma atitude tão simplista. Até porque há uma dúvida metódica que nunca deixará de me assolar. Uma questão que foi encapsulada numa frase do oncologista norte-americano Samuel Broder, diretor do Instituto Nacional de Oncologia dos EUA entre 1989 e 1995:

"Se estivéssemos dependentes do [SNS] para curar a poliomielite através de um programa dirigido centralmente (....) teríamos hoje o melhor pulmão de aço do mundo, mas não haveria uma vacina para a polio."

Outro exemplo: a URSS ainda conseguiu andar pelo espaço, mas nunca chegou à Lua. Os americanos fizeram-no em foguetões "de dois milhões de peças -- todas construídas por quem propôs preços mais baixos", como disse o astronauta John Glenn. E, no fim, o projeto espacial -- e o programa nuclear -- ajudou de sobremaneira a levar o regime planificado e centralizado soviético à falência.

Sem liberdade e concorrência não há inovação, sem inovação mata-se a imaginação, sem imaginação não há ciência. Sem ciência não pode haver nações nas quais valha a pena viver. Se algum dia chegarmos a esse ponto, mais valeria o futuro ser das cabrinhas.

Ricardo Simões Ferreira - no DN

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