Umas tem o mundo de menos, outras tem o
mundo de mais. Mas ao dizer que pode haver «de mais» de uma certa
espécie de liberdade devo apressar-me a acrescentar que a única espécie
de liberdade que considero indesejável é aquela que permite diminuir a
liberdade de outrem, por exemplo, a liberdade de fazer escravos.
O mundo não pode garantir-se a maior quantidade possível de liberdade instituindo, pura e simplesmente, a anarquia, pois nesse caso os mais fortes seriam capazes de privar da liberdade os mais fracos.
Duvido de
que qualquer instituição social seja justificável se contribui para
diminuir o quantitativo total de liberdade existente no mundo, mas
certas instituições sociais são justificáveis apesar do facto de
coarctarem a liberdade de um certo indivíduo ou grupo de indivíduos.
No seu sentido mais elementar, liberdade significa a ausência de controles externos sobre os actos de indivíduos ou grupos. Trata-se, portanto, de um conceito negativo, e a liberdade, por si só, não confere a uma comunidade qualquer alta valia.
Os Esquimós, por exemplo, podem dispensar o Governo, a educação
obrigatória, o código das estradas, e até as complicações incríveis do
código comercial. A sua vida, portanto, goza de um alto grau de
liberdade; contudo, poucos homens civilizados prefeririam viver assim a
viver no seio de uma comunidade mais organizada.
A liberdade é um requisito indispensável para a obtenção de muitas coisas valiosas; mas essas coisas valiosas têm de partir dos impulsos, desejos e crenças daqueles que desfrutam dessa liberdade.
A existência
de grandes poetas confere um certo brilho a uma comunidade, mas não se
pode ter a certeza de que a comunidade produzirá grande poesia só pelo
facto de não existir uma lei que a proíba. De uma maneira geral,
consideramos justo que se obrigue a juventude a ler e a escrever, ainda
que a maioria dos jovens preferisse o contrário; fazemo-lo porque
acreditamos em bens positivos que só um alto grau de alfabetização torna
possível.
Mas, ainda que a liberdade não constitua o total das coisas
socialmente desejáveis, é tão necessária para a obtenção da maioria
delas, e corre tanto o risco de ser insensatamente limitada, que mal
será possível exagerar a sua importância.
Bertrand Russell, in "Realidade e Ficção"
Bertrand Arthur William Russell, 3º Conde Russell (Ravenscroft, País de Gales, 18 de Maio de 1872 — Penrhyndeudraeth, País de Gales, 2 de Fevereiro de 1970) foi um dos mais influentes matemáticos, filósofos e lógicos que viveram no século XX. Político liberal, activista e um popularizador da filosofia, Russell foi respeitado por inúmeras pessoas como uma espécie de profeta da vida racional e da criatividade. A sua postura em vários temas foi controversa.
Russell nasceu em 1872, no auge do poderio económico e político do Reino Unido, e morreu em 1970, vítima de uma gripe, quando o império se tinha desmoronado e o seu poder drenado em duas guerras vitoriosas mas debilitantes. Até à sua morte, a sua voz deteve sempre autoridade moral, uma vez que ele foi um crítico influente das armas nucleares e da guerra no Vietnã. Era inquieto.
Recebeu o Nobel de Literatura de 1950, "em reconhecimento dos seus variados e significativos escritos, nos quais ele lutou por ideais humanitários e pela liberdade do pensamento".
Russell nasceu em 1872, no auge do poderio económico e político do Reino Unido, e morreu em 1970, vítima de uma gripe, quando o império se tinha desmoronado e o seu poder drenado em duas guerras vitoriosas mas debilitantes. Até à sua morte, a sua voz deteve sempre autoridade moral, uma vez que ele foi um crítico influente das armas nucleares e da guerra no Vietnã. Era inquieto.
Recebeu o Nobel de Literatura de 1950, "em reconhecimento dos seus variados e significativos escritos, nos quais ele lutou por ideais humanitários e pela liberdade do pensamento".
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